
O puerpério traz também o luto da mulher que fomos antes
O luto da mulher de antes: quando uma parte de nós também morre
“Ninguém me contou que depois do parto eu também choraria por mim.”
Essa é uma parte da verdade que poucas mães têm coragem de dizer em voz alta. O luto da mulher de antes acontece em silêncio. Ele se esconde entre fraldas, exaustão, um peito cheio e um coração confuso. Embora nenhuma morte literal tenha ocorrido, existe uma dor real: a morte simbólica de uma versão nossa — livre, espontânea, inteira em si mesma.
Quando tudo mudou e eu não percebi
Meu nome é Akina, sou mãe solteira de duas meninas gêmeas. Descobri esse luto numa terça-feira qualquer, no meio da tarde. Estava com uma das meninas dormindo no colo e a casa em silêncio. De repente, uma notificação antiga do meu e-mail apareceu: “Reunião de brainstorming 14h – agência central”.
Primeiro, sorri. Logo depois, fechei os olhos. Em poucos segundos, senti saudade. E então chorei.
As lágrimas vieram por aquela versão de mim que saía de casa de salto. Também chorei por quem criava campanhas com café na mão e música alta no fone. Senti falta da mulher que dizia “vamos tomar um vinho hoje?” sem precisar pensar na amamentação. Lembrei da que dormia a noite inteira, da que podia sentar e simplesmente comer — e quente. Por fim, pensei na que tomava banho sem pressa e dançava sozinha na sala.
Essa mulher não morreu de fato. No entanto, ela não está mais aqui. Apesar do motivo ser lindo, o desaparecimento dela ainda é uma perda.
Por que esse luto dói tanto?
Porque ninguém nos prepara para ele. Esperam que amemos ser mães desde o primeiro segundo. Cobram que estejamos realizadas, plenas e felizes. Contudo, esquecem de contar que, junto com o nascimento de um filho, nasce também um vazio. Esse espaço, a princípio invisível, vai crescendo aos poucos.
Trata-se da quebra da identidade. Uma transformação repentina do “eu” em “nós”. A diluição da individualidade em função do cuidado. Em muitos momentos, esse sentimento vem acompanhado de culpa. Afinal, como posso estar triste se tenho minhas filhas saudáveis nos braços?
Contudo, a maternidade não exclui a mulher. A dor de deixar partes de si para trás não diminui o amor pelas crianças. Pelo contrário, apenas revela o quanto a nossa história antes deles também importa — e merece ser honrada.
Esse luto passa?
Sim, ele muda de forma com o tempo. Aos poucos, a gente vai se reencontrando. Algumas partes retornam e outras renascem com um novo significado. Você pode, por exemplo, voltar a dançar na sala — agora segurando duas mãos pequeninas. Talvez redescubra o prazer de tomar um banho sozinha como um luxo. E, com sorte, ainda vai rir alto com amigas, mesmo que por chamada de vídeo, com um bebê mamando do outro lado.
Obviamente, isso leva tempo. Também exige permissão. Permissão para sentir. Para chorar. Para não ser só mãe o tempo todo. Acima de tudo, para lembrar que existe uma mulher aí dentro — viva, intensa, complexa.
Leitura complementar
Se você também está atravessando esse momento, talvez queira ler o post Culpa materna: como lidar com esse sentimento?. Muitas vezes, o luto da mulher de antes se confunde com culpa por sentir falta de si mesma. Entretanto, você não está errada. Está apenas humana.
Além disso, o Ministério da Saúde disponibiliza cartilhas sobre saúde mental materna. Esses materiais podem ajudar você a entender melhor essa fase e buscar apoio, se necessário.
Uma coisa é certa: você não está sozinha
Se você sente saudade de quem era, está tudo bem. Isso não te faz menos mãe. Te faz uma mulher que ama, que sente, que se transforma — e que está renascendo.
O Meu Pandinha está aqui pra lembrar você, e todas as outras mulheres que, assim como eu, vivem essa transformação sem rede de apoio ou romantização. A maternidade é real, intensa — e merece ser falada com verdade.
Com acolhimento e respeito,
Akina — mãe de gêmeas, mulher em reconstrução, fundadora do Meu Pandinha 🐼💐